O pagamento de participação nos lucros e resultados aos empregados não integra a base de cálculo da contribuição previdenciária devida pelas empresas, pelo fato de o benefício não ter natureza salarial. Esse foi entendimento firmado pela Câmara Superior do Conselho Administrativo de Recursos Fiscais a respeito do assunto no acórdão 9202003.370.
Em outra decisão envolvendo PLR, o Carf ainda definiu que o pagamento depende de um acordo prévio com os beneficiados, que pode ser fechado enquanto ainda se apuram os critérios para a divisão do total. E não há prazo mínimo entre o acerto e o pagamento, não cabendo à Administração Pública dizer o que a lei não estipulou.
Para os tributaristas Rafael Palma Bifano e José Henrique Longo, do PLKC Advogados, há uma clara previsão constitucional para desvincular os pagamentos de participação nos lucros da remuneração pelo trabalho. Contudo, o Fisco criou exigências formais visando desqualificar os programas de PLR e, por consequência, limitar de maneira indireta uma previsão constitucional, cobrando uma contribuição que não seria devida.
As recentes decisões do Carf sobre o assunto são relevantes, na opinião dos tributaristas, por indicarem a posição dos tribunais administrativos de que as formalidades observadas ao se firmar o acordo de PLR são aspectos secundários ao acordo de vontades entre empregador e empregado, e que não se prestam a definir a natureza do pagamento.
Muitos acordos coletivos de PLR são negociados e fechados no decorrer do ano base para o seu pagamento no ano seguinte. Assim, explicam os advogados, o posicionamento do Carf no sentido de que o fechamento do acordo deve ocorrer apenas antes do pagamento e durante o período de aferição dos critérios prestigia a prática de anos de negociação coletiva entre empregados e empregadores.
“Essa posição aumenta significativamente o nível de segurança jurídica dos empregadores quanto ao pagamento de PLR, ou seja, favorece a geração de renda e emprego”, comemora Thiago de Carvalho e Silva e Silva, especialista em relações do trabalho da PLKC Advogados.
De acordo com o advogado Jayr Viégas Gavaldão Jr., tributarista e sócio da Duarte Garcia, Caselli Guimarães e Terra Advogados, as decisões do Carf que tratam da PLR reafirmam o princípio da legalidade. O especialista destaca que na Lei 10.101/2000 há condições a serem observadas para que o pagamento do benefício não se sujeite à contribuição previdenciária. Dentre tais condições, está a celebração de acordo coletivo que defina as regras para pagamento, justamente porque a lei fomenta a negociação, o consenso entre os interessados.
“Como não há no regime legal qualquer prazo para a formalização desse acordo prévio, é vedado ao órgão fiscal impô-lo, criando nova condição para o pagamento PLR. A pretensão fiscal que foi afastada pelo Carf representa séria afronta ao princípio da legalidade, ao mesmo tempo em que restringe a concessão de tão importante benefício”, explica Gavaldão Jr.
O advogado Henrique Silva de Oliveira, tributarista e sócio do Trigueiro Fontes Advogados, escreveu recentemente artigo a respeito da não incidência de contribuições previdenciárias sobre as verbas pagas a título de PLR. Ele demonstrou como são dissonantes os entendimentos dos Tribunais Superiores e do Carf sobre o assunto.
“Percebe-se que o tema continua nebuloso. O RE 569.441 (caso paradigma do tema 344 de repercussão geral no âmbito do Supremo Tribunal Federal), ainda pendente de julgamento por ocasião da confecção do artigo, foi julgado em 30.10.2014. Não obstante, e ainda que o acórdão permaneça indisponível, é possível ler na ata de julgamento que a corte manteve o entendimento, esboçado em julgados anteriores, de que a norma de exoneração possuía eficácia limitada no texto da Constituição Federal de 1988. Ou seja, não poderia surtir efeitos antes da Medida Provisória 794/1994”, diz Oliveira.
Para ele, é difícil assumir que se trata de uma “imunidade de eficácia limitada”, categoria já sufragada quando da classificação da norma emanada pelo parágrafo7º do artigo 195 da Constituição (por exemplo, no RMS 26.932). O Superior Tribunal de Justiça, por isso, teve entendimento de se tratar de uma isenção (Recurso Especial 856.160).
O Carf, por sua vez, vem sedimentando entendimento de que a hipótese é de norma de imunidade. Segundo Oliveira, dois acórdãos proferidos recentemente (9202003.370 e 9202003.430) mostram que o órgão tem evitado interpretações tendentes a “amesquinhar a exoneração”.
Oliveira alerta os trabalhadores sobre o risco de PLR pesar na carga tributária: “Os contribuintes devem estar atentos, e os trabalhadores também. Muitos assumiram programas de participação nos lucros e resultados sob a justa expectativa e promessa constitucional de que teriam redução da carga tributária incidente sobre a folha de pagamentos. Com a substituição do fato tributário — de “folha de pagamentos” para “lucro bruto”, como vem sendo empreendido pelo governo federal —, o Estado brasileiro deu (uma imunidade, segundo o Carf) com uma mão; mas tirou com outra. É certo que legítimas discussões jurídicas advirão”.
Na opinião do tributarista Geraldo Wetzel Neto, sócio do Bornholdt Advogados, o Carf deu um passo na direção da flexibilização das normas trabalhistas. “Vale, porém, comentar que o cumprimento das disposições contidas nas leis 8.212/1991, e 10.101/2000 mantém um viés muito burocrático para que as empresas brasileiras possam implantar seus programas de PLR”, explica.
De acordo com Lucas Bizzotto Amorim, tributarista do Marcelo Tostes Advogados, foram acertadas as decisões do Carf que, protegendo o contribuinte, julgaram ilegal o ato do Fisco, “uma vez que a Receita Federal extrapolou, de ofício, os requisitos estabelecidos pela Lei 10.101/2000″.
Fonte: Conjur