A inclusão equivocada de pessoas na fase de execução trabalhista, derivando para o bloqueio indevido de saldos em contas bancárias, caracteriza erro judiciário passível de indenização. Por isso, a 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região manteve sentença que mandou indenizar um casal do norte do Paraná, que permaneceu no pólo passivo da ação trabalhista mesmo após ter sido excluído da ação na fase de sentença. O erro foi da Vara do Trabalho de Cornélio Procópio (PR), admitido e desfeito quase 60 dias depois.
Nos dois graus de jurisdição da Justiça Federal da 4ª Região, os julgadores foram unânimes em reconhecer que era cabível a indenização por danos moral e material — este para ressarcir os autores dos gastos com a contratação de advogado para corrigir o erro, o que permitiu o desbloqueio de valores de duas contas bancárias.
Para a relatora da apelação na corte, juíza convocada Salise Monteiro Sanchotene, existiu o necessário nexo de causalidade entre a conduta da União — por seus agentes — e o resultado lesivo. Por isso, em decorrência, impõe-se o dever de indenizar os danos causados.
“Especificamente no que se refere ao dano moral, não se pode negar que os autores, ao serem indevidamente incluídos na fase de execução da sentença trabalhista e terem numerários de sua titularidade indisponibilizados, sofreram constrangimentos que ultrapassam os meros aborrecimentos do cotidiano, máxime em se considerando o contexto em que ocorreram”, escreveu no acórdão, lavrado na sessão de 22 de outubro.
O caso
Pais e sogros, respectivamente, do casal dono de um estabelecimento comercial em Congoinhas (PR), os autores se viram envolvidos numa reclamatória trabalhista ajuizada em setembro de 2008 na 1ª Vara do Trabalho de Cornélio Procópio (PR). O juízo trabalhista, ao proferir a sentença, afastou-os prontamente do polo passivo da demanda, por entender que não ficou demonstrada sua responsabilidade solidária na ação.
Para o juiz Roberto Joaquim de Souza, ‘‘na surreal tese de defesa’’, é difícil ao homem médio entender as razões pelas quais os pais e sogros de simples locadores do prédio se imiscuiriam em sua atividade econômica da empresa reclamada. Sobretudo, a ponto de repassar parcelas trabalhistas aos empregados destes ou de contrastar a responsabilidade por um contrato de trabalho vigente entre novembro de 2005 e junho de 2008.
No segundo grau, ao julgar recurso que pedia a retificação da data de demissão na carteira profissional do ex-empregado, o acórdão do Tribunal Regional do Trabalho da 9ª Região (PR) não alterou a sentença na parte que deixou de acolher a reclamatória em relação aos autores.
Ao dar sequência ao processo, na fase de execução, o juízo da vara, de forma equivocada, não excluiu os autores da citação. Como não foram encontrados bens passíveis de penhora para satisfazer o crédito trabalhista, os autores acabaram voltando ao polo passivo da demanda. Resultado: em abril de 2013, eles tiveram bloqueados, pelo sistema BacenJud, um total de R$ 46,8 mil de suas contas bancárias.
Os autores, então, peticionaram à Justiça do Trabalho, pedindo a liberação dos valores bloqueados judicialmente — o que foi indeferido. Depois de muito peticionar, finalmente, em 5 de junho de 2013, a Justiça analisou seu Pedido de Reconsideração em sede Embargos de Declaração. Aí, os erros foram reconhecidos, e os valores bloqueados, liberados.
Indenização
Em face do ocorrido, ambos ajuizaram indenizatória contra a União. Pediram, para cada um, o pagamento de R$ 150 mil, a título de danos morais; e R$ 4,6 mil a título de danos materiais.
A União apresentou contestação. Disse que não veio aos autos nenhum elemento capaz de revelar a existência de um dano apto a caracterizar-se como indenizável, tais como eventuais prejuízos financeiros ou má-reputação decorrente de inscrição em órgãos de restrição de crédito. Argumentou que a responsabilidade do estado por ato de juiz não é objetiva, pois o nexo causal torna-se indispensável, sendo fundamental que o dano tenha sido causado por dolo — o que no caso não ocorreu.
Sentença procedente
O juiz Décio José da Silva, da 3ª Vara Federal de Londrina, escreveu na sentença que a imputação de conduta passível de indenização no âmbito jurisdicional só é viável em caso ação/omissão dolosa ou culposa. Ou seja, o estado tem o dever de reparar danos causados por seus agentes se estes apenas agirem com dolo e culpa. E este “erro judicial” ficou caracterizado na fase de execução do processo trabalhista.
Para o juiz, a informação de que os autores estavam excluídos da ação, por decisão transitada em julgado, deveria ter sido o suficiente para o Judiciário fazer uma análise mais detida a cerca da correção do bloqueio de valores. Mas isso não ocorreu. Foram necessáris quatro recursos, quase 60 dias depois, para que o equívoco fosse corrigido.
“Nesse aspecto é que reside a responsabilidade da União, uma vez que, por ausência do dever de cuidado de seu agente, os autores acabaram sendo indevidamente incluídos na fase de execução do julgado e tendo valores de sua titularidade indevidamente bloqueados”, complementou.
Com a fundamentação, o juiz federal julgou a ação indenizatória parcialmente procedente, determinando o pagamento do dano material no valor solicitado na inicial (total de R$ 9,2 mil). O valor arbitrado serve para o ressarcimento de custas judiciais e dos honorários advocatícios, uma vez que os autores comprovaram, nos autos, a contratação de advogada para ajuizar a ação reparatória.
“Ademais, é verossímil que os Autores tenham sido expostos a constrangimentos: seja porque tiveram os nomes publicados em editais como devedores; porque tiveram cheque devolvido pela não provisão de fundos; e porque tiveram de se socorrer a terceiros para emprestar dinheiro para honrar seus compromissos’’, justificou, ao reconhecer a ocorrência de dano moral. O valor da indenização, entretanto, foi arbitrado em R$ 10 mil para cada autor, seguindo a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça para casos semelhantes.
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