A Instrução Normativa 600/2005, que vigorou nos exercícios fiscais de 2006 a 2008, gerou milhares de autuações fiscais por parte da Delegacia da Receita Federal, que deixou de homologar créditos tributários dos quais as empresas tributadas pelo lucro real tinham direito.
Muitas dessas autuações administrativas foram levadas ao judiciário, onde a jurisprudência já sinalizava o êxito dos contribuintes, mas aos 31/10/2014 foi publicada uma decisão do Carf, no processo 15374.966351/2009-51[1], que revogou expressamente a IN 600/2005, e ao aplicar as disposições da IN 900/2008, acabou aplicar a retroatividade de norma mais benéfica ao contribuinte.
Tal decisão abre precedente para que todas as empresas autuadas ou executadas judicialmente pela mesma fundamentação, tenham finalmente seus créditos reconhecidos como válidos.
A questão em debate se referia à possibilidade (ou não) ao aproveitamento dos créditos recolhidos a maior por estimativas, tendo em vista que o artigo 10 da IN 600/2005 determinava que o montante recolhido a maior somente poderia ser compensado após o encerramento do ano-calendário, vedando expressamente a utilização no mesmo período.
Mas, a decisão do Carf reconheceu que havia um erro na IN 600/2005, o qual foi corrigido posteriormente pela IN 900/2008, e com isso, considerou válidas as compensações efetivadas pelo contribuinte com base nos recolhimentos feitos a maior, a título de estimativas mensais, sob o fundamento de sua Súmula 84: “Pagamento indevido ou a maior a título de estimativa caracteriza indébito na data de seu recolhimento, sendo passível de restituição ou compensação.”
O julgado ao dar efeito retroativo à IN 900/2008, fez valer o artigo 105 do CTN, que prevê a aplicação da legislação tributária aos fatos geradores futuros e aos pendentes, assim entendidos aqueles cuja ocorrência tenha tido início.
Outros dispositivos legais que, servem de embora não tenham sido citados expressamente no voto do relator do Carf, servem de fundamento justificador de sua correta decisão, entre eles, o Código Tributário Nacional (artigo 156, II e 170), que prevê a extinção do crédito tributário através da compensação, e também a Lei 9.430/96 (artigo 74), que estabelece o direito ao sujeito passivo compensar créditos tributários com débitos administrados pela Secretaria da Receita Federal.
O Carf ainda manteve inabalada a regra por estimativa aplicada às empresas pelo lucro real, normatizada no artigo 2º da Lei 9.430/96, “a pessoa jurídica sujeita a tributação com base no lucro real poderá optar pelo pagamento do imposto, em cada mês, determinado sobre a base de cálculo estimada, mediante a aplicação, sobre a receita bruta auferida mensalmente (…).” Dispõe ainda que a pessoa jurídica que optar pelo pagamento do imposto na forma do referido artigo deverá apurar o lucro real em 31 de dezembro de cada ano.
E por fim, a Lei 9.784/99, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, em seu artigo 2º, dispõe sobre a obrigatoriedade de obediência à vários princípios constitucionais, onde se destaca o da legalidade, que certamente foi privilegiado ao afastar a eficácia da IN 600/2005, em razão desta destoar do sistema legal em vigor.
Mas, se ao contrário disso, o Carf mantivesse as exigências da IN 600/2005, o Estado estaria se apropriando indevidamente de valores que não lhe pertencem, tendo em vista que as instruções normativas não podem restringir, inovar ou modificar os textos das leis.
Com isso o Carf consolida sua missão de assegurar à sociedade a imparcialidade nas decisões, e alcança seu objetivo de ser reconhecido pela excelência no julgamento dos litígios tributários.