O direito à informação, previsto na Constituição, não diz respeito a qualquer dado ou movimentação feita pela autoridade fiscal. Existem outras formas de conciliar os direitos do cidadão à informação pertinente à atuação dos agentes públicos, sem que isso impeça o exercício do poder de polícia e de fiscalização inerente ao Poder Público.
Com a prevalência deste entendimento, a maioria dos integrantes da 4ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região negou pedido de um empresário paranaense que queria saber quem e por que seus dados foram acessados na Receita Federal. O autor entrou com recurso na corte porque a ação foi julgada extinta no primeiro grau, por impossibilidade jurídica.
O desembargador Cândido Alfredo Silva Leal Junior, que capitaneou o voto vencedor, detalhou os motivos pelos quais não se alinhou com o entendimento do relator do caso na corte, que concedeu a ordem para que o fisco fornecesse as informações ao contribuinte.
Para ele, o direito à informação não é absoluto ou incondicionado, nem abrange qualquer dado ou movimentação. Do contrário, corre-se o risco de, em breve, se pretender que a autoridade fiscal decline de instaurar procedimento contra o contribuinte só porque pensou ou cogitou tal possibilidade.
Em segundo lugar, discorreu, é preciso considerar que existe uma esfera de atuação interna do órgão público que está fora do alcance da curiosidade alheia.
‘‘Terceiro, porque transformar as repartições públicas em algo escancarado à curiosidade externa acabaria por impedir qualquer atuação fiscal ou exercício de poder de polícia. O cidadão estaria constantemente se dirigindo aos órgãos públicos, para saber se estava sendo alvo de alguma investigação, e orientaria sua conduta para dificultar ou impedir essas fiscalizações’’, escreveu no acórdão.
Segundo o magistrado, atender o pleito do contribuinte, nestes termos, seria o mesmo que obrigar um desembargador a franquear acesso irrestrito dos advogados às minutas de decisões ou aos projetos-de-voto que estão em elaboração no seu gabinete.
‘‘Seria como dizer que o advogado tem direito, antes da sessão de julgamento, de saber o que está pensando o desembargador ou os demais integrantes da turma julgadora, na elaboração e composição do voto que está examinando. Quais os livros consultou o desembargador? Qual pesquisa de jurisprudência fez seu assessor? Quais dúvidas tem o julgador? (…) Ainda que se trate de serviço público e ainda que o cidadão tenha direito de acesso à informação, isso não se confunde com desnudar absolutamente o agente público de quaisquer possibilidades de realizar seu trabalho e previamente preparar o que lhe cabe’’, encerrou. O acórdão foi lavrado na sessão do dia 17 de dezembro.
O caso
O autor, ligado ao ramo cartorário, foi à Justiça para obrigar a unidade da Receita Federal em Maringá (PR) a revelar quem e por que motivo acessou suas informações fiscais no período compreendido entre 1º de agosto de 2008 e 7 de junho de 2011. Exigiu saber nome, qualificação, endereço e local de trabalho. E mais: quer saber a pedido de quem cada acesso foi feito.
O delegado local informou que o Habeas Data — ação para tomar conhecimento de informações — não era cabível, já que os dados dos sistemas informatizados da Receita são de interesse apenas do órgão e de seu controle interno de atuação. Por consequência, pediu a extinção do processo sem resolução de mérito.
Ao analisar o mérito da ação, o juízo local, com apoio do parecer do Ministério Público Federal, entendeu que os dados geridos pela Receita Federal não são destinados ao conhecimento de terceiros, ressalvadas as hipóteses legais e restritas de relativização do sigilo fiscal.
‘‘Ademais, o remédio constitucional [Habeas Data] deverá ser concedido se comprovado o uso abusivo de registros de dados pessoais, se coletados por meios fraudulentos ou se conservados com fins diversos dos autorizados por lei’’, registrou a sentença.
Assim, por considerar ausente o interesse de agir e incabível o emprego de Habeas, o juízo julgou extinto o processo, sem resolução do mérito, com base no artigo 267, inciso VI, do Código de Processo Civil. Diz o dispositivo: ‘‘quando não concorrer qualquer das condições da ação, como a possibilidade jurídica, a legitimidade das partes e o interesse processual’’. Desta decisão, o autor apelaou ao TRF-4.
Fonte: Conjur